O processo para ter uma comunicação não-violenta não é uma tarefa fácil. Afinal, nascemos em uma sociedade que se comunica de forma violenta e acredita que é a melhor maneira de solucionar os conflitos.
Esse tipo de agressão verbal nem sempre se manifesta em forma de gritaria, palavrões, xingamentos e ameaças. Ela também ocorre de uma forma disfarçada e bem sutil, através da manipulação emocional, sentimento de culpa, julgamentos moralistas, chantagens e posturas defensivas. Essa linguagem bloqueia os instintos humanos de compaixão e solidariedade, gerando assim preconceitos sobre as pessoas.
Algumas frases características da CNV (comunicação não-violenta) são formadas por comparações como “Você não é tão competente quanto o seu colega de trabalho.”; chantagens “Se você realmente quisesse esse emprego, faria o que estou pedindo.”; e não assumindo a responsabilidade, atribuindo a culpa para outras pessoas “Ele pediu que eu fizesse, o erro é dele não meu!”.
É comum ter a ideia de que a CNV é uma forma de passividade, de não se envolver em conflitos e ficar calado perante situações que não gostamos, mas é o oposto disso. Essa comunicação preza pela exposição das ideias e necessidades de uma maneira respeitosa e empática. Ou seja, a não violência é a ação de conquistar nossos direitos sem causar mal ao outro, dialogando para que as duas partes sejam ouvidas e entendidas.
A aplicação da CNV no ambiente de trabalho
Tudo influencia a forma como os colaboradores se mantêm em uma empresa: o ambiente de trabalho, a questão de remuneração, reconhecimento, relação com colegas e chefe, a oportunidade de crescimento e muitos outros.
Então, se um desses quesitos está ruim, isso pode infundir todos os outros e resultar tanto em uma demissão, quanto em um mal comportamento. Por isso, ambas as partes – gestores e colaboradores – precisam aprender a lidar com essas situações.
Para isso, existem 4 passos de como aplicar a comunicação não-violenta em qualquer situação cotidiana no trabalho:
1º PASSO – OBSERVAÇÃO
Fazer a observação da situação sem julgamentos ou interferências. Muitas vezes quando vamos apontar um erro de alguém, deixamos nossas avaliações interferirem no modo como falamos com o outro.
Ou seja, quando é apontado um engano com uma lente avaliadora, a chance da outra pessoa se sentir atacada e ficar na defensiva é muito alta, pois ao ouvir uma crítica, tendemos a nos defender e para não ter essa reação do outro, o modo de falar influencia muito.
Dar feedbacks generalizados, que denotam habilidades, diminuindo o outro, em momentos inoportunos, usando sarcasmo, trazendo questões do passado. Todos esses exemplos podem fazer com que a pessoa se sinta colocada contra a parede, não escute o feedback de maneira positiva e provavelmente vá sentir raiva de quem o fez.
Por isso, um exemplo de CNV em uma observação é, “notei que nas últimas semanas você anda chegando atrasado e isso não é bom para o rendimento da empresa.”, essa é uma maneira específica, sem julgamentos e aponta o comportamento do colaborador sem ser agressivo, porque em muitas situações não são feitas as análises verdadeiras dos fatos.
2º PASSO – SENTIMENTOS
Identificar o que foi sentido com a situação, pois demostrando o que sentimos – na maioria das vezes – conquistamos a empatia da outra pessoa.
Saber como demonstrar seus sentimentos é parte crucial da CNV, pois quando sentimos que a outra pessoa não está entendendo nossos sentimentos é onde a violência entra, seja ela verbal ou psicológica. Mas é preciso ter muita consciência desses sentimentos, para não os confundir com não sentimentos.
Como reconhecer emoções, sentimentos ou não sentimentos?
As emoções ocorrem de modo irracional pois estão presentes no nosso subconsciente e não conseguimos controla-las, elas funcionam como reflexos da nossa mente. As emoções dão origem aos sentimentos e as cinco principais são alegria, tristeza, medo, raiva e nojo.
Já os sentimentos funcionam com racionalidade e são influenciados pelo nosso passado, pelas experiências vividas, aprendizados e cultura.
Por outro lado, os não sentimentos são julgamentos maquiados de sentimentos que passam uma falsa sensação de falar o que está sentindo, gerando assim interpretações sobre os outros que podem ser ou não verdadeiras, além de estar tirando a responsabilidade dos sentimentos de si e jogando para o outro.
Exemplo de como expor seus sentimentos com a CNV é, “fiquei chateado pela forma que você me interrompeu na reunião de ontem”, nesse exemplo é apontada uma situação na qual é exposto o sentimento de maneira clara e sem ataque.
3º PASSO – NECESSIDADE
Encontrar qual necessidade está envolvida e o que está precisando que o outro faça por você. Reconhecer suas necessidades nem sempre é fácil, mas precisamos ter esse conhecimento para supri-las, pois nossas necessidades são a origem dos nossos sentimentos e quando elas não são providas ou escutadas, a “solução” desse conflito mal resolvido será a violência.
O criador da comunicação não-violenta, Marshall Rosenberg falou “Quando expressamos nossas necessidades indiretamente, através do uso de avaliações, interpretações e imagens, é provável que os outros escutem nisso uma crítica, e quando as pessoas ouvem qualquer coisa que soe como crítica, elas tendem a investir sua energia na autodefesa”.
Por exemplo, para demonstrar uma necessidade usando a CNV é “Você poderia me entregar o relatório até amanhã de manhã por favor? É que eu preciso terminar o trabalho, mas não consigo sem sua parte”, com essa frase a pessoa expõe sua necessidade e ao mesmo tempo mantêm uma postura profissional sem cair no sentimentalismo, além de ser uma forma muito mais saudável de demonstrar sentimentos e necessidades.
4º PASSO – PEDIDO
Quando percebemos que uma necessidade não está sendo atendida, é importante pensar de qual forma o outro pode atender seu pedido e dar a ele a solução. E por isso, os passos anteriores da CNV constroem o caminho para o passo final, o pedido.
Aprender a fazer um pedido de forma clara é ponto crucial para que o outro entenda o que você está tentando dizer, afinal, não espere que o outro realize um pedido que ainda não foi feito ou que as informações necessárias não foram passadas, pois muitas vezes podemos achar que estamos sendo claros, mas acabamos maquiando o que realmente queremos para amenizar a situação e não mostrar vulnerabilidade.
É preciso ter em mente que o ser humano é um ser social e precisamos uns dos outros para várias atividades do dia a dia, não no sentido de dependência, mas no quesito de que precisamos da reciprocidade e da ajuda do outro.
Como fazer pedidos claros?
Algumas dicas para fazer pedidos claros, sem esconder nenhuma informação e com que o outro entenda e não se sinta atacado.
É importante evitar alguns hábitos da fala como o uso do “não”, pois é considerado uma linguagem agressiva que não dá uma saída para algum comportamento errado. Ao invés de focar no lado negativo e no lado que não se deve fazer, foque no positivo e peça aquilo que você quer que aconteça.
Outro hábito para se evitar são frases generalizadas e vagas, pois isso deixa em aberto muitas questões no que está pedindo e principalmente, o outro pode acabar realizando errado o pedido e chatear ambos. É preciso formalizar solicitações concretas e que sejam possíveis de serem realizadas pelo outro.
Um exemplo de pedido completo usando todos os passos da CNV, “Percebi que nessas duas semanas você anda meio disperso com as tarefas que te mandei, isso me deixa preocupado com você e com a empresa, pois temos prazos que precisam ser cumpridos, então você poderia tentar focar mais?”, é possível perceber com o exemplo abaixo uma construção de observação e demonstração de sentimentos e necessidades até chegar ao pedido final e garantir uma comunicação mais empática.
Para concluir, possuir a capacidade para enfrentar conflitos de maneira respeitosa é indispensável para o crescimento profissional, pois a inteligência emocional é necessária para todas as áreas profissionais, além de se tornar uma pessoa mais compreensiva com os próprios erros e os erros do outro, utilidade essencial para o ambiente de trabalho.
Autora: Mariana Rocha
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